facto III

morrer sim, deixar-te não
Antes que o tempo passe, inspiro para não sufocar


#

te(n)são

Tudo estava fechado, nenhum vento ousara entrar no quarto, no nosso gelado quarto. Sim, estava gelado. Não sabia se era da tensão que pairava no ar, mais que todo o oxigénio. Nós, tremíamos de frio e os olhos pesavam, fechavam, no entanto, não tínhamos sono. A tensão apoderava-se de todas as minhas forças, das tuas também?, não dizíamos nada, sentia vergonha e medo...
Demorou em acabar, essa noite, pareceu infinita, interminável...

(...)
Aliás, ainda não acabou, todas as noites são assim, com ou sem ti.




















"O CHÃO QUE PISAS SOU EU"






[Linda Martini]

Aliás, já a tenho nas mãos.




Como as folhas no Inverno caem, o meu coração também cai.
Está seco e torna-se fraco para aguentar. Para aguentar as palavras que saem da tua boca. As reacções que tens. A maneira como me tratas. A maneira como interferes na minha vida.
Cai dentro do meu corpo. O meu coração cai cada vez mais.
Estás bem na vida. Considero que também estou, apesar de o meu coração continuar vazio a vadiar no meu corpo. Sinto que já não me pertence mais.
Como no Outono as folhas caem, a minha folha vital também cai.




Aliás, já a tenho nas mãos.


Logo atrás de ti

"Esta dor não passa quando adormeço
chora ao pé de mim
irremediável

alguém nos toca no ombro e
damos por nós mais sozinhos

o meu lugar na morte
é junto da janela
logo atrás de ti"


mário rui de oliveira

incapacitada


E é assim que fico quando tudo me foge pelos dedos. E é assim que fico quando vejo tudo avançar e sou eu a única parada no mesmo lugar. É assim que fico quando não tenho nada em que focar, quando atinjo a impaciência e quero mais. Quero ser mais. Quero ter mais. Quero dizer e poder mais. Quero ter-te. E é assim que fico quando tudo me escapa e não consigo agarrar, por qualquer razão que seja... tal razão que nao está ao meu alcance. É assim que fico quando é já de noite e sinto que nada de importante fiz enquanto o sol ainda brilhava. Quando me encho de nada e desligo, desligo... E é sempre o mesmo, e é por isto que fico assim.

facto II

Perco esperanças, ganho juízo.

frio

Os lábios ficavam secos, as mãos gélidas e o meu corpo tremia... O vento húmido e frio que entrava na sala, fazia-me arrepiar, tornando a minha pele áspera, sensivel ao toque..., tudo isto fazia doer e eu venerava algo quente que me levasse para um estado completamente oposto.
O sol não tardou em aparecer e toda a neve do jardim, derreteu... Eu não me mexia, não me sentia capaz de tal coisa, não tinha força... Estava cansada de esperar.
Mais uma vez estava ali, sentada no chão, a observar o corredor, à espera de ter ver passar. As horas não paravam, os ponteiros do relógio moviam-se freneticamente e a minha sombra mudava de lugar repetidamente... eu simplesmente esperava, por ti, pelo teu amor que tardava em aparecer. Esperava ver-te aproximar e poder olhar-te nos olhos mais uma vez.
Ficou noite, mais um dia acabara de passar. Tudo havia diminuido, a luz do sol, a minha força, a minha esperança... Mas eu continuei à espera, à espera de tudo aquilo que contrariamente de agora, me fez sorrir e sonhar...

fecha-a

Fecha a porta. Chora o que tens a chorar e berra. Está a chover, as nuvens choram contigo. Estás sozinha. Reparo que estás triste, é normal. Deita tudo cá para fora e desabafa. Ninguém te ouve. Estás irritada, é compreensível. Podes espernear e agir de forma brutalmente brusca que eu irei entender-te. Precisas de uma mão para apertar para devorar, de um abraço forte e alguém que te valorize tal como és.
Agora aproveita a calma que paira no quarto; deita-te e dorme. Respira fundo e aproveita a gélida brisa que penetra o teu espaço pela janela aberta. Não te preocupes com o frio que te invade pois as tuas lágrimas irão aquecer-te, são quentes, vêm do teu profundo ser, aí de dentro. Entra na onda do silêncio e relaxa. Estás sozinha. Relaxa que a porta está fechada…

estava escuro

Estava escuro. E eu com a cabeça apoiada nos joelhos, ia rodando e rodando na minha cadeira amarela. A cadeira cada vez rodava com mais força e, a minha mão gélida tentava encontrar uma superfície a que me agarrar. Queria parar mas não conseguia. Era já noite e os fortes trovões que vinham acompanhados com a sua irritante chuva, assustavam-me. A luz ofuscante de cada um fazia-me tremer de medo. Estava sozinha e não me apetecia fazer nada de nada. Queria parar e agir de maneira normal para com tudo o que me rodeava, mas não me apetecia. O que mais queria no momento era ganhar asas e voar dali para longe, para um sitio mais fácil e sem essa chuva e trovões onde não tivesse que enfrentar tudo isto. Toda esta ausência, solidão e tormento.
Voar, fugir para um sítio onde não pudesse ficar assim, sem forças e calor.
Enquanto rodava e rodava cada vez com mais força, fazia questão de pensar em ti, de como tudo entre nós se passou num ápice, como estas voltas que dava na minha nova cadeira. É estranho e talvez aborrecido aproveitar cada momento de um dia assim, nostálgico, para fazer questão de pensar em ti, mas o facto é que não pára de acontecer. É cada vez mais inevitável pensar em ti, melhor, em todos os nossos momentos, apesar de serem poucos, para mim significaram muito. Todos os olhares, todos os beijos, abraços e gargalhadas que trocamos, que agora são apenas momentos que restam ser recordados, deixam-me assim num dia como este, triste e fraca.
Tudo isto por já não te ter. Por já não poder voltar a agarrar toda a tua carne, sentir a tua cara próxima da minha, por já não poder cheirar o teu perfume, tocar em todos os teus cabelos longos, por já não poder ouvir o teu riso, por já não sentir os teus beijos, por já não te ter...
E é tudo uma questão de já não te ter, de já não estares aqui comigo, para me fazer rir, para me aquecer e me acompanhar num dia como este

facto I

E teimas em lá aparecer.
Em todos os meus sonhos.
O que é que nos unia? O que é que nos fazia permanecer juntos e intactos a todas as objecções que teimavam em permanecer á nossa volta?
Éramos, somos tão diferentes. O que é que nos unia? Sabes?
Encho-me de perguntas, às quais não encontro uma boa resposta, uma resposta que me faça esquecer o assunto e arranjar outro que ocupe os meus tempos livres.
Agora tenho esta a vadiar na minha cabeça. O que é que realmente nos unia?
É triste ter que dizer unia e não une. É sempre triste quando tenho que usar o passado para nos descrever, a nós, a nossa relação.
É isso, apenas passado. Não gosto.
Estou triste a pensar nisto. Tu sabes, será que sabes o que quero dizer com isto tudo? Com este palavreado todo? Sabes?
Se sabes diz-me…

Ontem adormeci a ver-te dormir.

Ontem adormeci a ver-te dormir. Estavas de tronco nu, deitado de barriga para baixo e dormias tão profundamente que fiz de tudo para não te acordar. Por momentos consegui ver-te calmo, suave e a sonhar. Estavas tão diferente do dia-a-dia, aquele teu quotidiano agitado e frenético, onde te exaltas por tudo e por nada e berras palavras que doem ao ouvir sempre que te zangas com alguém. Gostei de te ver assim. Observei-te pelo menos durante vinte minutos e soube mesmo bem!
Subitamente deu-me vontade de um último cigarro. Enquanto procurava o isqueiro para o acender, mexeste-te. Disseste palavras que não entendi e sons que não captei. Mexeste-te bruscamente e saltei com a agitação toda, e enquanto expelia o fumo do cigarro pela boca, disses-te o meu nome…
Fiquei sem perceber se ao entrar no teu sonho, o tornaria bom ou mau. Se estavas a discutir comigo ou a dizer que me amavas… não percebi. Adorava que me dissesses que me amas, quase que não o dizes, não sei se és tímido ou se trancas os sentimentos a sete chaves no teu duro coração.
Apaguei o meu cigarro e abanei as mãos em meu redor para que o fumo se alastrasse e não ficasse acumulado no quarto. Deitei-me ao teu lado e beijei a tua solene cara, apetecia-me agarrar-te dizer muito alto que te amo e que adoro estar contigo, mas apenas te beijei levemente a testa e adormeci a olhar para ti…

Hoje voltei a sonhar contigo...


Desta vez pareceu tão real! Sonhei que voltara a ser da mesma turma que tu, sonhei que estava perto de ti e que sentia apenas o teu cheiro e que apreciava o tecido do teu casaco, era áspero e preto. Nesse mesmo sonho não conseguia ver a tua cara, estavas de costas, mas mesmo assim o meu coração palpitava tanto, só por te poder ver nem que de costas fosse, que até temia que alguém o pudesse ouvir bater! Acordei numa mistura de emoções, estava agitada mas também contente, pensei que fosse mesmo verdade, mas depois de ver que estava apenas a sonhar, o meu coração parecia partir-se em cada bocadinho cada vez mais pequenino sempre que olhava em meu redor e via que estava apenas numa solarenga manhã no meu quarto, senti uma desilusão tão grande por ver que nada que tinha sonhado fazia parte da realidade, da dura realidade. Não sabes o quão difícil é acordar todas as manhãs e não ter motivação para passar o lápis preto nos olhos, não ter razão para vestir a roupa que mais gostamos, nem conseguir dar alegria a um dia cinzento e chuvoso, só por sentir tanto a tua falta. Não sei se contigo se passa o mesmo. Sem ti é tão difícil viver…, não vou dizer que não sei viver sem ti porque iria ser mentira, pois tenho mesmo que viver sem ti, não tenho outra alternativa. Separamo-nos e agora cada minuto que passa, sem te ver, parece que o meu corpo desfalece e perde a noção de como se arranja forças para ser feliz novamente. Não sei o que se passa comigo, sonho contigo sempre que fecho os olhos. Sempre que vejo algo que me lembre a tua suave cara, imagino-te a olhar para mim ou então, isolo-me de tudo que está a minha volta e retrocedo na minha tenra adolescência e recordo todos os momentos que passamos juntos, todas as visitas de estudo ou quase todas em que me abraçavas ou me davas a mão, oh isso sabia tão bem, sentia que por uns minutos eras meu e de mais ninguém, mas depois quando saíamos da camioneta lá ias tu, o super engatatão fazer o que me acabara de fazer a mim a outra rapariga. Aí sim, o meu corpo desabava e o dia por mais cinzento que fosse, tornava-se ainda mais negro e o que apenas me apetecia fazer era desatar a chorar e cair no chão e nunca mais me levantar!